segunda-feira, 8 de janeiro de 2024

Zagallo, o odiado mais querido do mundo


Nunca gostamos de Zagalo. Aliás, dava muita alegria desgostar de Zagallo, o homem que "roubou" o emprego do comunista João Saldanha por obra e graça do ditador Medici, segundo se conta.

Mas os fatos nos obrigam a uma análise mais fria e justa.

O Velho Lobo foi o maior vencedor da história do futebol mundial. Das sete copas que participou, ganhou quatro (1958, 1962, 1970 e 1994), foi vice em uma (1998) e quarto lugar em outra (1974). Só não levou nada em 2006.

Além dos títulos, teve um papel audacioso e decisivo para montar a melhor seleção de todos os tempos, a brasileira de 1970.

Quando trocou o Edu, um ponta-esquerda clássico, pelo armador Rivelino e consolidou Tostão como falso centroavante - quase imitando o pivô do basquete -, fez uma revolução tática sensacional, com um time composto por quatro meias esplendorosos que atacava de forma compacta, com a bola no pé, e se defendia desde a intermediária do adversário.

O time de Saldanha era sensacional, claro, mas dentro de um tradicional 4-2-4 que poderia ter problemas com times europeus de marcação cerrada. O 4-5-1 de Zagalo, por sua vez, dominava o meio-campo, liberava Carlos Alberto para subir pela direita, alimentava Jairzinho o tempo todo (marcou em todos os seis jogos!) e dava show em todas as partidas, graças à concentração de talentos no miolo do jogo.

Zagallo merece maiores louros pelas mudanças que fez em 70, antecipando vários técnicos que depois fariam sucesso.

Só por isso deveria ser honrado como um dos maiores treinadores de todos os tempos.


TEXTO DE:
Thiago Muniz

Zagallo: Por quem os sinos dobram

Dado o inevitável da vida, a passagem de Zagallo sugere muitas reflexões sobre o futebol brasileiro, onde ele é uma página eterna do nosso esporte há décadas.

Como jogador, reinou por Flamengo e Botafogo depois de passar pelo America. Do jovem recruta do Exército no Maracanã diante do Uruguai ao campeão mundial na Suécia, a distância é de apenas oito anos. Do quase corte da Seleção à consagração em 1958, com direito a gol do título, foram apenas alguns meses. E dos palcos suecos para o Chile, apenas mais quatro anos. Se parássemos por aqui, o Velho Lobo já teria um currículo monumental, mas o destino lhe reservou muito mais.

Não há dúvidas de que a maior Seleção Brasileira da história começou a ser desenhada por João Saldanha, mas também é impossível não reconhecer que o Brasil do México 1970 foi todo reescalado e adaptado por Zagallo, dos cinco camisas 10 no ataque ao miolo de zaga com Piazza recuado. É o time dos sonhos que se tornaram realidade.

Do campeão pelo Fluminense em 1971 ao gol de falta de Petkovic em 2001, Zagallo viveu trinta anos dourados. Ganhou e perdeu títulos, viveu novas emoções com a Seleção Brasileira. Comemorou o Brasil tetracampeão mundial nos EUA como coordenador técnico, foi vice mundial na França em 1998. Estava no Botafogo quando o Alvinegro alcançou o recorde brasileiro de invencibilidade em 1978, com 52 jogos. E faturou petrodólares nos primórdios do futebol árabe.

Seria impossível para um homem de tamanho mundial não se envolver em controvérsias e polêmicas pelo caminho, mas todas são pequenas diante de sua estatura. Tão grande que já era imortal muito antes da própria morte, anos depois de sua última grande aparição pública, conduzindo a tocha olímpica no Rio de Janeiro para os jogos de 2016.

Por fim, sua longa e gloriosa trajetória também se mistura ao folclore, como na superstição com o número 13 que sempre lhe acompanhou. Se pensarmos em expressões como "Brasil campeão" ou "Seleção de Ouro", ambas possuem exatas treze letras - e fazem todo sentido como o desfecho de uma vida espetacular, vitoriosa e que agora deita em berço esplêndido.

É que os sinos dobram pela vitória.


TEXTO DE:

@p.r.andel