Dizem por aí ( e quem sou para discordar ), que esta fábula é de Esopo.
Me contaram mais ou menos assim.
Mais que um pouco para menos que um pouco para mais, pois o mais fui eu que não deixei de menos.
O que sobrar ou faltar se deve a mim.
Se não me mentem, sementes.
Para sua mãe já bem velhinha, um carretel de linha.
Para sua esposa magricela, uma panela.
Para a filha perneta, uma caneta.
E para o filho...
Bem para o filho, sobrou ir com ele.
Sobrou também para o burro, que haveria de carregar as compras de volta à fazenda.
Só de imaginar ter de carregar peso, o burro emburrado, ficou todo cismado.
Mas não teve escolha o coitado, foi amarrado e levado.
Na estrada porém, o pai, o filho e o burro logo encontraram uma senhora idosa que muito apegada aos netos sacudiu o punho para o fazendeiro e foi logo soltando:
- Como pode uma criança ser obrigada a caminhar, sendo que tens ai a mão um burro forte que ele bem poderia montar? Se o filho está cansado, culpa do pai desnaturado. - se foi.
O pai, olhou o filho, e lhe ordenou:
- Monte no burro, filho. Não quero que me acusem de desnaturado por nada neste mundo.
E foram assim...
O pai, o burro, e o filho montado no burro.
Mais em frente cruzaram outra senhora na estrada. Esta vinha com um povo do colégio. Lá era professora, e foi logo ensinando sem ser perguntada. Mas era esperta a danada...
- Veja você. Pois fosse no meu tempo, um filho não faria assim ao pai. Mas os tempos modernos são assim. Não foram feitos para mim. No meu tempo o mais idoso ia montado e a pé ia o filho do lado.
O filho, olhou o pai e pediu:
- Pai, vai montado o senhor. Eu vou do lado caminhando. Pois se não quer ser desnaturado, não quero ser chamado mal-educado.
O pai montou, o filho foi do lado.
Mas não é que a estrada era longa, e muitas pessoas iam por ela?
Mais a frente, encontraram outro bocado de gente.
Duas freiras bem intencionadas, mas que ficaram muito transtornadas.
A mais velha disse a mais nova, ou a mais nova a mais velha, quem me contou não soube afirmar com certeza:
- Que pai mais cruel, donde já se viu ir tranquilo a montar, enquanto vê seu filho caminhar? Que tipo de pai é esse que não pensa no filho? Não sei o que mais Deus pode fazer por este mundo.
O pai olhou o filho, e lhe disse:
- Monta na garupa, meu filho. Assim, agradamos a todos e não seremos desnaturados, mal-educados e nem pecadores diante de Deus.
E montaram o dois no burro.
Mas nada termina, enquanto não chega ao final.
E enquanto não se chegava a cidade, mais pessoas se cruzavam pela estrada.
E dos jovens formandos vindos da capital, com diploma e chapel, viram pai e filho, e logo foram colocando seus estudos em prática. Um bacharel em direito o outro não menos nem mais.
- Ora veja. Como podem maltratar assim um animal? Num sol como esse obrigar o bicho caminhar e carregar duas pessoas? Não seria exagero prender os dois por maus-tratos ao animal.
- Fosse na capital e houvesse lei, estariam os dois na cadeia. Deveriam carregar o burro nas costas para ver se é bom.
- Mas também, que podemos esperar desta gente desnaturada? Com certeza foi mal-educada. Por isso cometem tal pecado contra Deus, e a natureza.
Pai e filho, desmontaram, pegaram o burro e foram para a cidade carregando o bicho nas costas.
Não queriam ser desnaturados, afinal tinham tido boa educação e eram tementes a Deus.
Quando entraram na cidade foram por todos recebidos.
Gargalhadas e aplausos. Só podiam ser de circo, afinal, carregar daquele jeito um animal?
Ou eram loucos ou eram ambos burros por igual.
Até mesmo o prefeito aproveitou e pediu mais votos, porque fosse eleito outra vez, haveria de ter muito mais espetáculos e circos na cidade.
O pai e o filho, compraram suas coisas e resolveram largar o burro. Pois este lhes causou muitos problemas.
Foram para casa, sem burro, para não ter problema com nada.
Mas e o burro?
Quem me contou, contou e jurou, que o burro concorreu a prefeitura.
E venceu.
Pois este aprendeu muito com o homem.
Principalmente a não dar ouvidos ao que o homem tem pra dizer.
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